terça-feira, 28 de agosto de 2012

Como que eu consigo ficar?

Você me perguntava de todas as formas como que era conseguir ficar num lugar só. Jogava indiretas e tentava arrancar respostas que eu não possuia. Eu só sabia ficar. Eu sempre soube. Ao contrário de você. Eu sempre fui a mais medrosa de todos os medrosos do mundo, mas meu medo nunca foi suciente para me impedir de entrar em quartos escuros e enfrentar todos os monstros que ali se escondiam. Utilizo metáforas para explicar: eu só fico, meu bem. Eu fico mesmo quando tudo indica que já é hora de partir, mas eu nunca respeitei o relógio e seus ponteiros malucos. Eu fico porque apesar de todos os "não" que a vida esfrega na minha cara, ainda existem milhares de "sim" que o vento sopra todo fim de tarde. Mas eu permaneço, sempre permaneci. 

Lembro quando você disse que eu era um pássaro e eu fiquei mais de uma semana tentando organizar essas palavras na minha cabeça. Pássaro, amor? Você é um pássaro. Eu sou no máximo um filhote com asas defeituosas. Sempre quero voar, conhecer o mundo, viajar sem rumo e retornar só no inverno para o meu ninho. Sempre quero, mas nunca posso. Porque eu não passo de um filhote, porque meu coração me pede para ficar ao lado de quem me protege. Mesmo que quem me proteja esteja sempre tão distante, procurando novos horizontes para voar, novas vidas para viver. Eu fico estática e não te culpo. Porque você não tem culpa de usar suas asas, da mesma forma que eu não tenho culpa de ter defeitos nas minhas e de ficar te esperando voltar. E você me pergunta de novo e de novo como que eu sei ficar.

Eu sei que uma hora nós temos que aprender a voar sozinhos, da mesma forma que eu sei que apesar de todos os defeitos das minhas asas, uma hora eu vou saber abrí-las. Tenho a leve sensação de que já voei muito por esse mundo buscando o que eu achei exatamente em você. Penso que em certo momento, eu me amedrontei demais por voar tão sozinha que me encolhi feito um verdadeiro filhote esperando seus carinhos. Porque foi em você que eu encontrei minha proteção para esses dias tão compridos, foi em você que eu achei a proteção contra o frio e o vento que me arranhava inteira. Foi no seu ninho que eu achei meu lugar. Mas você continuou voando, eu fiquei e fiquei e você permanecia me perguntando como que eu conseguia ficar, meu Deus?

Eu só queria que ao invés de você perguntar como, você me pedisse para te ensinar a ficar. Juro que eu ensinaria. De coração aberto.

Ou talvez você poderia me ensinar a abrir as asas de novo.
Adoraria voar com você.

Tanto faz. Só queria sua companhia.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Depois do campo de visão.

Te ver sentado na minha sacada não era meu plano principal. Mas ali está você. Tão lindo. Encostando o queixo no parapeito e olhando para o shopping lá no fundo do horizonte. Você está todo curvado e com as pernas inquietas com o pensamento fixado em alguma parte do mundo que não me convêm saber qual. Queria te invadir, mas você está tão lindo assim que nem tenho coragem de te encostar. Fico sentada nessa mesinha de mármore bem do seu lado só te olhando e fico bebericando meu chá enquanto você não tira o olho do fim do horizonte. O fim do horizonte que você sabe que não é o fim, o fim do horizonte que esconde o aeroporto e todas aquelas casas. Um avião vem chegando devagar e pousa bem atrás do fim do horizonte. E você sorri. Eu fico impotente com o seu simples sorriso para um avião e me pergunto porquê você tinha que ser tão lindo. Seu sorriso fica fixado na sua boca até o avião sumir do seu campo de visão. Você continua na mesma posição e eu continuo escrevendo te olhando. Pouco me importa a cidade lá fora, a vista da sacada é bonita, mas ver você se admirando com o mundo é muito mais incrível. Seu cabelo curto balançando de forma ritmada e você olhando para além do horizonte.

"Já pensou que o ser humano é muito limitado?", você pergunta e eu te olho. Continuo escrevendo e você continua. "O mundo é muito mais do que nós vemos. Esses sentimentos, essas sensações, essa dor existencial que todos sentem, tudo é demasiado exagero. Somos muito limitados.", você suspira e eu te olho. Sorrio e recebo um sorriso de volta. Você sai da posição inicial e se senta na mesa, bem na minha frente. "Queria que as pessoas vissem o mundo como você.", você diz enquanto coloca uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha e eu sinto minhas bochechas arderem.

"O que eu vejo demais?", pergunto curiosa.
"Você vê além.", você diz apenas. Silêncio. "Eu tenho aprendido com você.", você completa.
"Obrigada.", é tudo que consigo dizer.

Você se vira, volta a observar o horizonte, o shopping, fica esperando algum avião pousar, fica esperando algum barulho te tirar do transe, fica esperando alguém te acordar, fica esperando que eu te puxe e te diga alguma coisa que vá te acalmar, alguma coisa que te faça esquecer da nossa limitação, do nosso minúsculo tamanho, da nossa incompreensão. Mas eu não tenho coragem porque você está tão lindo olhando o mundo ao seu redor.

E eu me sinto quase completa por saber que nós dois vemos além. Mesmo que isso ainda seja muito limitado e não seja o suficiente. A vida exige mais do que isso de nós. Mas você não exige mais do que temos conosco. Eu repito umas três vezes baixinho que você é lindo demais e tiro uma foto sua da forma que você está, puxo fundo o ar e te falo rapidamente:

"A verdade é que foi você quem me ensinou.", você me olha por alguns demorados segundos. Você sorri e volta a olhar a cidade. Eu sei que você me entende. Eu sei que havia sido o suficiente para te acalmar, para me acalmar e para poder continuar te olhando até a hora que for preciso levantar daqui para acender a luz e te levar para dentro de casa.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

A cabana que a gente nunca fez.

Eu tinha planos incontáveis para nós, você também. Todo aquele clichê de casinha com jardim e filhos sorridentes. Sem nem pensarmos nas impossibilidades. Enquanto eu dava crises pelas minhas dores inexplicáveis de cabeça, você me acalmava pacientemente falando qualquer coisa no escuro que fazia a dor passar devagar, antes que eu percebesse já não estava sentindo dor alguma. O meu melhor remédio sempre foi você, para qualquer dor. Enquanto o Sol explodia lá fora e o mundo me estressava mais do que eu pensava suportar, você dizia do dia de amanhã e eu complementava com minhas frases bobinhas. Sem pressa e com muita calma. Te suspirava vontades insanas e você queria muito realizar cada uma delas, queria mesmo, eu sei que sim. Insanidade sempre me acompanhou, mas aumentei a dose dessa sensação quando sua voz se aproximava. Um tremelique estranho se apossava de mim e eu fingia normalidade, fingia que o coração não disparava, fingia que o mundo não estava rodando só para poder parar o tempo e te ouvir. Seu bocejo alto demais, sua risada baixa demais, seu tom de voz quando você sorri, seu tom de voz quando você se aborrece. Tudo está marcado em mim, por baixo de toda essa casca que eu uso na frente de qualquer um. Ninguém sabe a razão que me faz olhar para o lado e abaixar os olhos de uma forma melancólica, ninguém sabe o que me faz sorrir do nada.

Reviro meu baú de memórias para juntar uma a uma e me perder por horas e horas nessas noites que a insônia não me larga. Você sabe que eu tenho medo de passar a noite sozinha, mas para não te atrapalhar, passo a noite apenas com nossas lembranças. Tenho coragem de dormir de porta fechada, mas não tenho coragem de ficar de olhos abertos no escuro, por isso que eu fecho os olhos e respiro fundo tentando juntar nossos segredos em alguma sequência lógica. Acabo me confundindo com o que nós compartilhamos e o que foi apenas fruto da minha imaginação fértil. Embaralho todos os pensamentos e me pego sorrindo. A madrugada vai avançando e eu continuo pensando, continuo sonhando e pensando em uma forma de te dizer que meu amor é na medida certa para você.

Todas as noites penso nos milhares de encontros e desencontros que nos acompanham desde sempre, penso nos planos e nos bilhetes. Nos presentes e nos sussurros. Mas em uma noite em especial pensei na cabaninha de cobertas enroscadas pelas cadeiras. A cabaninha que a gente nunca fez. Nós nunca juntamos as cadeiras e nem penduramos os lençóis. Nunca retiramos os móveis do quarto e jogamos almofadas e travesseiros no chão para podermos deitar. Nunca mesmo. Só queria te dizer que eu tenho os lençóis, os cobertores, os travesseiros e as almofadas. Está tudo bem guardado te esperando, te juro.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Dormiu?

Tenho andando na ponta dos pés para não acordar meus medos, escrever não me acalma mais e a paz que eu preciso, encontra-se muito longe daqui. Longe em todos os sentidos, literais ou não. Às vezes, me sinto fora da realidade e ando pela casa de madrugada, bebo minha água, já sinto os olhos arderem e vou para sacada acender um cigarro sem que ninguém me pergunte nada, sem que ninguém me olhe enquanto eu deixo as cinzas caírem no mesmo ritmo que minhas lágrimas e sem que ninguém me questione porquê eu tenho fumado, porquê eu tenho chorado. O silêncio da cidade me invade e eu observo os prédios enquanto um cigarro segue o outro e eu já começo a sentir minha típica falta de ar depois de tanto chorar. Se você estivesse aqui, já teria me dado um beijo na testa e me levado de volta para a cama. Mas nem ouso pensar em você porque eu sei, eu sei que você continua. Sempre em frente. Você continua com seus amigos, com seus bares, suas ruas e suas cervejas. E eu só queria que você parasse, parasse e voltasse para pegar na minha mão. Nem que fosse uma vez, uma única e última vez. Eu te implorava o que não se deve implorar a ninguém e eu sei que um dia você vai me odiar por tudo que eu fiz a nós. A sua dor foge inteiramente de você e se aloja em mim nessas noites vagas demais. Todos seus sentidos dormentes e eu completamente desperta. Sinto falta de conversar sobre o nosso amor, dormir serena e acordar desesperada no dia seguinte por ter te largado acordado sozinho. Agora você consegue dormir sem nem ao menos dar sinal de vida. E eu só te espero. A insônia não me deixa. E eu fico esperando. Esperando que a porta se abra ou que meu telefone toque. Mas não. Ainda não. Quem sabe depois.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Vôo sem escalas partindo em cinco minutos. Última chamada.

Querido, hoje eu coloquei suas últimas peças de roupas restantes dentro de uma mala bem pequenininha, deixei com o porteiro e dei seu número a ele. Falei bem assim: "Liga e pede pra ele buscar", só. Chorei igual criança enquanto guardava sua camiseta dos "Bananas de Pijamas" e ainda estou com medo de remexer nos seus objetos jogados pelo banheiro porque tenho certeza que há milhares de fantasmas seus entre a sua escova de dente verde-musgo e aquele seu protetor bucal nojento e babado que você usava para fingir que lutava boxe pra depoir vir me fazendo cócegas e me pedir beijo. Como que eu tinha coragem de te beijar com aquele pedaço de gosma na sua boca?

Por que você me largou, baby? Eu sei que pareço uma cantora de músicas desesperadas falando assim. Cantora eu nunca fui, você sabe bem. Mas ah, o desespero já fez morada dentro de mim e tem sido muito frequente todos os dias. Voltei a fumar. Menos pelo vício e mais porque você sempre odiou que eu fumasse. Só que enquanto você ainda estava comigo, isso nem era problema pra nós porque eu largava meus cigarros e abusava de um vício muito melhor que era o vício que eu tinha por você, pelo seu cheiro de natureza depois da chuva e outros detalhes do tipo. Agora que você já bateu a porta na minha cara e nem ao menos tocou a campainha para me pedir perdão, eu tenho certo prazer em segurar um cigarro entre os dedos só para me lembrar da sua voz arranhando dizendo: "Para, amor".

Preciso confessar que já te liguei diversas vezes desde aquele dia. Já te liguei em todos os horários mais inusitados, mas apenas de números que você não conhece. Não quero te dar esse prazer de me ver correndo atrás de você. Liguei de orelhões na madrugada para ouvir sua voz de sono, liguei do celular de amigos no fim da tarde pra ouvir sua voz exausta depois do trabalho. E nunca tive coragem de dizer nada. Nunca tive coragem nem de ao menos fingir que eu era atendente de uma empresa de telemarketing. Ouvia sua respiração, seu "Alô" enjoado de sempre e esperava você desligar. Diversas vezes você ficou uns cinco minutos em silêncio e repetiu o mesmo "Alô" umas trezentas vezes antes de desligar  — me pergunto se em algum momento você sabia que era eu e se você só queria me dar coragem para dizer algo. Coragem que eu nunca tive, coragem que eu nunca vou ter.

Eu sempre me pergunto se algum dia você vai se arrepender, fico horas deitada na cama olhando uma foto nossa que eu ainda não tive coragem de jogar fora e me pergunto se você vai se arrepender. Fico pensando que em algum momento você vai fingir que somos personagens principais de algum filme meia-boca e que você vai vir correndo pro meu apartamento para confessar que não sabe viver sem mim. Fico jurando pra mim mesma que o telefone vai tocar quando eu menos esperar e sempre finjo estar bem distraída, mas me traio dando uma olhadela cautelosa pro celular de cinco em cinco minutos. Eu me pergunto se você não tem remorso por ter me tratado daquela forma enquanto eu só te dava todo amor que havia em mim. Eu só queria que você tivesse um pouco de medo de me perder para quem me achasse andando por aí, que você tivesse medo de que quando eu saísse pelas ruas para beber sua ausência, alguém poderia me pegar no colo e me levar embora. E se eu resolvesse ir embora de vez, amor? Pro Alaska, pro Canadá ou pra Nova Zelândia, hein? Será que você acordaria a tempo de me impedir de ir? Diz que sim.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Pedaços soltos de nós.

Junto pedaços seus por todos os cantos, mas quando te observo, você continua todo desconfigurado. Continua com um pedaço rachado e outro pedaço sem encaixe. Aí começa a me olhar com essa cara de quem já não quer mais ficar, só pra ver se eu não te quebro em milhares de pedaços e te deixo livre pra não ser nada. Mas que triste seria, amor. Que triste seria não ser nada. E como eu nunca te obedeci, sempre fui contra tudo que você dizia, eu te empilhava no canto da sala, tomava um café e te observava em silêncio até alguma ideia brilhante aparecer na minha mente. E eu passava noites e dias e madrugadas e estações inteiras tentando nos consertar, mas você nunca percebia, nunca entendia e sempre me olhava com a mesma cara de antes. Eu me encolhia no canto pensando o que eu estava fazendo de errado e você nunca falava. Eu dava tudo de mim e você nunca falava. Eu ficava naquele blábláblá sem pausas enquanto tentava te fazer lembrar dos nossos planos, dos nomes dos nossos futuros filhos, dos nossos cachorros e você ficava naquele silêncio do tamanho de um abismo que eu nunca entendia. Eu me quebrava toda pra ver se alguma pecinha de mim te ajudaria a se reconstruir, eu tentava me encaixar e sempre ficava com uma parte de mim solta. Eu só implorava bem baixo pra você me ajudar, pra você me cuidar, pra gente se cuidar juntos. Mas você não ouvia. E de alguma forma, eu tirava forças não sei de onde, pra me recompor sozinha e lutar por você mais uma vez. Só mais uma. Última vez, promessa. As últimas vezes nunca foram últimas. Não creio que algum dia vão ser.

Eu fico, juro que fico. Mas me pede pra ficar.