sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Desce aqui.


O telefone tocava e tocava e tocava. Eu só suspirava e insistia para que parasse antes que eu me rendesse. Mas ele era insistente... Ligou umas cinco vezes e na sexta eu resolvi atender. Eu não estava com vontade de olhar pra sua cara, mas acho que escutar sua voz não teria problema. Ai, doce ilusão.
— Alô? — Ele disse como quem não queria nada, mas eu sabia que queria muito. Queria tudo.
— O que você quer? — Mostrei minha resistência e ele soltou um suspiro misturado com um riso contido. Meu coração se apertou de irritação. 
— Queria saber se você quer tomar um ar, ficar presa nesse apartamento se escondendo de mim não vai te levar a lugar nenhum, sabia? — Sua voz era divertida e eu teria rido se não estivesse tão cheteada.
— Quem te disse que eu estou presa no meu apartamento? Eu sai hoje... — Menti muito bem, eu acho.
— Não venha mentir para mim, eu te conheço bem e sei que está mentindo. — A voz dele ficou rouca e uma onda elétrica passou pela minha espinha.
— Por que você faz isso? Sério, me resp... — Antes que eu continuasse, ele me interrompeu.
— Além do mais, eu estou te observando. — Ele suspirou novamente. — Faço o que, menina? 
— Isso. Como assim você está me observando? — Corri para a janela do meu quarto e olhei para a rua. Bingo. — O que seu carro está fazendo aqui na porta?
— Você não viu? Estou aqui desde ontem. Só sai para ir na padaria hoje cedo... Por isso que eu soube que estava mentindo. — Ele abriu a porta do carro e se colocou em pé do lado de fora. Esticou seus braços e acenou para mim. Eu estava escondida atrás da cortina, mas ele sabia que eu estava olhando. — Retribui meu aceno, um ato de educação faz bem, às vezes... — Eu acenei pra ele e pensei em mostrar o dedo do meio, mas desisti.
— Você deve estar drogado, mandei você parar de cheirar farinha. — Fiz uma piada ruim, mas ele soltou uma risada absurdamente alta. Não sabia se ouvi o som chegar pelo lado de fora ou pelo celular, pelos dois talvez. Como que eu cogitei ficar sem aquela risada?
— Eu não estou drogado, estou apaixonado. — Silêncio. Silêncio. Ele continuou. — Eu não queria ter te magoado na festa ontem, eu não queria ter feito um monte de coisas. Mas fiz. Pra te provocar, talvez? Não sei. Mas te peço desculpas.
— Você é patético.
— Você é linda.
— Que raiva...
— Te amo.
— Meu Deus, como você faz isso?
— Desce aqui que eu te conto.

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